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sábado, 1 de abril de 2023

1º álbum do Secos & Molhados faz 50 anos sem perder a aura de clássico

Primeiro álbum do grupo Secos & Molhados faz 50 anos sem perder a aura de clássico da música brasileira

Cinquentenário do disco de 1973 acontece em meio a briga judicial pelo uso do repertório em ainda inédita série documental sobre a banda que uniu Ney Matogrosso, João Ricardo e Gerson Conrad.

1º álbum do Secos & Molhados faz 50 anos sem perder a aura de clássico
Foto: Antonio Carlos Rodrigues

As informações são do Portal de Notícias G1, de sexta-feira 31/03/2023 por Mauro Ferreira (Jornalista carioca que escreve sobre música desde 1987, com passagens em 'O Globo' e 'Bizz'. Faz um guia para todas as tribos)

♪ MEMÓRIA ♫ DISCOS DE 1973 – Gravado entre maio e junho de 1973 no estúdio Prova da cidade de São Paulo (SP), tendo sido lançado pela gravadora Continental em agosto daquele ano repleto de marcantes estreias fonográficas na música brasileira, o primeiro dos dois álbuns de estúdio do grupo Secos & Molhados com a voz de Ney Matogrosso faz 50 anos em 2023 sem perder a aura de clássico e o status de título antológico da discografia brasileira.

Contudo, o cinquentenário do disco Secos & Molhados acontece em meio a brigas. Compositor cujo nome figura nos créditos de 12 das 13 músicas do repertório lapidar do álbum, João Ricardo está em litígio judicial com a produtora de ainda inédita série documental sobre a trajetória fulminante desse grupo que afrontou o sistema repressor do Brasil de 1973 com músicas de alto quilate poético e com a postura cênica libertária do trio, personificado na figura andrógina do vocalista Ney Matogrosso. João Ricardo vetou o uso das músicas na produção.

Briga nenhuma abafa o poder de sedução do disco, antológico a começar pela capa, criação do fotógrafo Antonio Carlos Rodrigues. Na capa, os então quatro integrantes do conjunto – João Ricardo, Ney Matogrosso, Gerson Conrad e Marcelo Frias – têm as cabeças entregues de bandeja, servidas como pratos principais do banquete tropicalista, já com a maquiagem que caracterizaria a imagem visual do grupo. Frias, então no posto de baterista e percussionista, rejeitou a mise-en-scène e decidiu pular fora da formação oficial da banda, perdendo a chance de entrar para a história da música brasileira.

Em cena desde 1971, o Secos & Molhados ganhou a voz e o rosto de Ney Matogrosso por intermédio de Luhli (1945 – 2018), que apresentou o então desconhecido Ney de Souza Pereira a João Ricardo. A voz de Ney fez toda a diferença diante da grandeza do repertório. “Cheguei e encontrei o repertório pronto e já gostei de cara. Percebi logo a qualidade das canções”, atestou Ney em depoimento para edição do álbum em CD fabricado em 2008.

A maioria das 13 canções foi criada a partir de poemas já pré-existentes, geralmente musicados por João Ricardo e eventualmente por Gerson Conrad, parceiro do poeta e compositor carioca Vinicius de Moraes (1913 – 1980) em Rosa de Hiroshima, um dos hits atemporais do repertório gravado com mix original de folk, MPB e rock e que poderia ter totalizado 14 músicas se a censura tivesse liberado Tem gente com fome (João Ricardo e Solano Trindade), composição que conseguiu permissão para vir ao mundo somente em 1979, em disco solo de Ney Matogrosso (há quem sustente, no entanto, que a censura de Tem gente como fome foi feita quando o grupo gravava o segundo álbum de estúdio).

Mas Sangue latino – grande sucesso do álbum ao lado de O vira e da já citada Rosa de Hiroshima – ostenta versos escritos por Paulinho Mendonça para a melodia de João Ricardo. O contorno do baixo de Willie Verdaguer na introdução da música se tornou tão marcante que o instrumentista merecia crédito de coautor da composição.

Autora da letra de O vira, musicada por João Ricardo, Luhli contribuiu decisivamente para o sucesso da faixa ao sugerir que o arranjo embutisse estilizações da música portuguesa na batida de rock'n'roll da gravação. Hit radiofônico na época, O vira seduziu o público infantil, alheio aos toques políticos de O patrão nosso de cada dia – música criada solitariamente por João Ricardo, tal como Assim assado – e de Mulher barriguda, composição surgida de poema de Solano Trindade (1908 – 1974), musicado por Ricardo e gravado em ritmo de boogie.

Já Amor e Primavera nos dentes – música gravada com o toque progressivo em voga no universo pop da época – se originam do fato de João Ricardo ter musicado dois poemas do pai, João Apolinário (1924 – 1988), jornalista português que seria transformado em empresário do grupo, fato que causaria discórdia entre os integrantes por conta da dispensa do empresário anterior, Moracy do Val, que exerceu a função com heroísmo quando ninguém imaginava que aquele grupo desconhecido de 1971 quebraria a indústria da música em 1973, com recordes de vendas de discos e lotações de shows.

João Ricardo também firmou parceria com Gerson Conrad em El rey e virou parceiro do poeta Manuel Bandeira (1886 – 1968) em Rondó do capitão, uma das poucas músicas obscuras do repertório do álbum. As outras são As andorinhas e Prece cósmica, ambos originadas de poemas do ensaísta e nacionalista paulista Cassiano Ricardo (1895 – 1974) musicados por João Ricardo.

Com arranjo de Zé Rodrix (1947 – 2009), a canção Fala – outra parceria de João Ricardo com Luhli, autores de O vira – representa pico de beleza melódica no fecho desse álbum que completa 50 anos sem dar sinais de envelhecimento artístico.

Por mais que o sucesso do grupo esteja associado ao contexto social e político específico de 1973, a alta qualidade do repertório do álbum Secos & Molhados vem transcendendo o tempo pela força imortal da música e do canto de Ney Matogrosso.

Ney é voz impagável de disco que, ainda que também tenha se alimentado da beleza dos arranjos coletivos e das harmonizações das vozes do trio, resiste antológico pela combinação de grandes canções com um cantor da mesma dimensão do repertório.

Leia outros textos da série memorialista do Blog do Mauro Ferreira sobre grandes álbuns brasileiros que fazem 50 anos em 2023:

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